Justiça determina despejo de locatários que descumprem regras de isolamento.

Decisões foram proferidas por juízes do Guarujá, no litoral de São Paulo
Dois locatários de apartamentos localizados em um mesmo condomínio no Guarujá, município no litoral de São Paulo, estão sendo despejados pela Justiça por insistirem em usar a área social do prédio, como piscina e academia de ginástica.
 
Além disso, teriam promovido festas em seus apartamentos durante a madrugada, em meio à pandemia de covid-19.
 
O Judiciário tem evitado conceder ordem de despejo. O que caminha no mesmo sentido do Projeto de Lei n° 1.179, aprovado pelo Senado, que também proíbe a medida por meio de liminares até dia 30 de outubro, por causa da pandemia. O texto agora só depende de sanção presidencial.
Os casos analisados, porém, foram considerados excepcionais pelos juízes. Para eles, as condutas, classificadas como antissociais, colocam em risco a saúde de todo o condomínio.
 
Apesar de não estar prevista em lei, a Justiça tem aceitado aplicar a pena de expulsão contra os chamados condôminos antissociais – proprietário ou locatário que ultrapassa todos os limites do aceitável, tornando quase impossível a convivência.
 
A postura do condômino antissocial é prevista no parágrafo único do artigo 1.337 do Código Civil. O dispositivo prevê apenas multas, que podem chegar a dez vezes o valor do condomínio para aquele que atentar contra o sossego, a segurança, a saúde e os bons costumes dos demais moradores. Em outros países, como Argentina, Espanha, Alemanha, Suíça, México e Guatemala, a pena de expulsão está em lei.
 
Depois de diversas reclamações e multas, o locador dos apartamentos resolveu entrar na Justiça com pedido de liminar para despejar os locatários, uma vez que ele poderia ser responsabilizado pelas penalidades em caso de falta de pagamento.
 
De acordo com o artigo 59 da Lei do Inquilinato (nº 8.245, de 1991), os despejos só podem acontecer no fim da da tramitação dos processos. Só são concedidos despejos por liminar em casos em que não há garantia ou fiador.
 
Contudo, segundo o advogado do locador, Caio Mário Barbosa, do escritório Duarte Garcia Serra Netto e Terra Advogados, na atual situação de pandemia, nada adiantaria se os despejos ocorressem só no fim da ação. Por isso, ele se valeu do ado artigo 300 do Código Civil para entrar com tutelas de urgência (espécie de liminar).
 
“Precisávamos de uma medida imediata, uma vez que faziam uso indevido das áreas comuns que estão fechadas e eventos em suas unidades, com aglomeração de pessoas, o que neste momento é absolutamente inadequado”, diz Barbosa.
 
Em um dos casos analisados (processo nº 1003154-24.2020.8.26.02 23), o juiz Gustavo Gonçalves Alvarez, da 3ª Vara Cível do Guarujá, destacou que o conjunto de provas “evidencia o reiterado descumprimento das normas do condomínio pelos réus, em época tão sensível que a população vivencia”.
Diversas reclamações de condôminos do edifício foram anexadas. Elas apontam, segundo a decisão, “comportamentos anti-sociais, como utilização de som em volume superior ao permitido e em horários inconvenientes, bem como a utilização de área comum desativada de forma precária por conta da pandemia do covid-19”.
 
Até mesmo outros locatários de imóveis, acrescenta o magistrado na decisão, “estão rescindindo seus contratos em virtude das atitudes lamentáveis tomadas pelos réus juntamente com outros condôminos”.
Ele lembra ainda que a situação não se reverteu mesmo com a imposição da primeira multa fixada, “o que poderá gerar agravamento das multas e aumento do risco de que o prejuízo final, caso não concedida a liminar, inverta a finalidade da locação”. E deu o prazo de 15 dias para que desocupem o imóvel. A decisão é do dia 29 de abril.
 
A outra decisão, concedida pela juíza Gladis Naira Cuvero, da 2ª Vara Cível do Guarujá (processo nº 1003501-57.2020.8.26.0223), também indica as reiteradas reclamações de condôminos, com aplicação de duas multas. “Tais fatos indicam o desrespeito à convenção e regulamento interno do condomínio e ao sossego condominial (artigo 1336, inciso IV do Código Civil por analogia a sua condição de morador do imóvel)”, afirma.
 
Para o advogado Fauaz Najjar, do Liserre & Najjar Sociedade de Advogados, as decisões estão corretas. “Neste momento de isolamento social tem que prevalecer o interesse coletivo sobre o particular”, diz. Nos casos, os imóveis eram alugados como casas de veraneio. “Os outros condôminos que estão isolados, não podem ter seu sossego perturbado com barulho e falta de respeito e ainda sob o risco de contraírem covid-19.”
 
Luís Rodrigo Almeida, do Dib Almeida Laguna e Manssur Sociedade de Advogados, afirma que decisões como essas devem começar a se proliferar no Judiciário. Ele entende que o artigo 1.336 do Código Civil é claro no se no sentido de que tanto proprietários quanto inquilinos devem zelar pelo sossego, salubridade e segurança do condomínio. “São medidas necessárias para evitar a disseminação do vírus”, diz Almeida.
 
Mesmo que o Projeto de Lei nº 1.179/2020 seja convertido em lei, futuras decisões judiciais como essas não perderiam a validade, de acordo com Almeida.
 
Mesmo que o Projeto de Lei nº 1.179/2020 seja convertido em lei, futuras decisões judiciais como essas não perderiam a validade, de acordo com Almeida. Isso porque a proibição de despejo por liminar, no artigo 9º, não abarca situação de descumprimento de regras do condomínio, como a proibição de uso de áreas comuns em tempos de pandemia.
 
FONTE: VALOR ECONÔMICO