Senado aprova novas regras transitórias de direito civil e de locação de imóveis

Em mais uma votação remota (via internet), o Senado aprovou nesta sexta-feira (3) regras para flexibilizar relações jurídicas privadas durante a pandemia de coronavírus. O PL 1.179/2020, do senador Antonio Anastasia (PSD-MG), visa atenuar as consequências socioeconômicas da covid-19, de modo a preservar contratos e servir de base para futuras decisões judiciais. A proposta segue agora para a Câmara dos Deputados. 

Segundo o senador, dado o caráter emergencial da atual crise, a intenção é criar regras transitórias que, em certos casos, suspendam temporariamente algumas exigências legais. Questões tributárias, administrativas, de natureza falimentar ou de recuperação empresarial não foram incluídas, devendo ser tratadas por outros projetos em andamento no Congresso Nacional. 

A proposta aprovada foi um substitutivo elaborado pela relatora, Simone Tebet (MDB-MS), que, além de emendas próprias, incorporou ao texto original parte das 88 emendas oferecidas pelos senadores. 

Motoristas

Durante a votação, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) apresentou pedido de destaque (votação em separado) de uma emenda do senador Fabiano Contarato (Rede-ES) para beneficiar motoristas de aplicativo, reduzindo temporariamente em 15% o repasse que os profissionais são obrigados a fazer às empresas. 

— Se as próprias empresas defendem que não há vínculo empregatício e há uma relação privada entre empresa e parceiro, agora, com muito mais razão, temos que ter um olhar muito mais sensível. Os motoristas não têm direito a nada, nenhum benefício trabalhista, e ainda estão expostos a grande risco. Em vez de reter do profissional 10 reais numa corrida, a empresa vai reter 8,50. Estamos tirando apenas daquelas grandes corporações, que ganham US$ 14 bilhões no mundo. Será que elas não podem reduzir um pouco o ganho? O que não pode é sempre o pobre pagar a conta — defendeu Contarato. 

A maioria dos partidos liberou as bancadas, mas a relatora, o líder do governo, Fernando Bezerra Coelho, e o MDB votaram contra, sob o argumento de que o assunto também trata de direito administrativo. Eles alegaram ainda que os motoristas serão beneficiados com o auxílio de R$ 600 a ser dado pelo governo, conhecido popularmente como coronavoucher. 

O argumento de Contarato sensibilizou os colegas e a emenda foi aprovada com 49 votos favoráveis e 27 contrários. 

Medidas

O projeto é extenso, dividido em 12 capítulos, que fazem alterações em diferentes normas, incluindo Código Civil, Código de Defesa do Consumidor, Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais e Lei do Inquilinato

O projeto diz, por exemplo, que não se concederá liminar para desocupação de imóvel urbano nas ações de despejo ajuizadas até 30 de outubro de 2020. O comando é válido para ações iniciadas a partir de 20 de março. 

A relatora retirou o artigo 10 do texto original que permitia o atraso no pagamento de aluguel por conta de demissão, redução de carga horária ou diminuição de remuneração por conta da pandemia. Segundo ela, é preciso considerar, por outro lado, que há locadores que sobrevivem somente dessa renda. 

As normas extraordinárias também deverão regular as relações em condomínios residenciais. O síndico terá poderes emergenciais para restringir o uso de áreas comuns; limitar ou proibir a realização de reuniões, festas, uso de estacionamentos, inclusive privativos, por terceiros como parte da estratégia para evitar a disseminação do coronavírus. 

A assembleia condominial presencial e a respectiva votação dos itens de pauta poderão acontecer, em caráter emergencial, por meio virtual, também até 30 de outubro deste ano.  O meio remoto poderá ser adotado ainda para viabilizar assembleias e reuniões em sociedades comerciais.

No tocante às relações de consumo, a proposta determina, até 30 de outubro de 2020, a suspensão da aplicação do direito de arrependimento previsto no artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor. A regra vale somente para compras de produtos perecíveis ou de consumo imediato e também de medicamentos. Com isso, não vale o prazo regular de sete dias para arrependimento. 

Em relação ao regime societário, a proposição prorroga até 30 de outubro todos os prazos legais para realização de assembleias e reuniões e para divulgação ou arquivamento das demonstrações financeiras. Além disso, assembleias e reuniões em sociedades comerciais podem ser virtuais e e dividendos e outros proventos podem ser antecipados. 

O projeto ainda estende o prazo de abertura e de conclusão de inventários e partilhas,  determina a prisão domiciliar para quem não pagar pensão alimentícia e suspende algumas infrações de ordem econômica em tempos de pandemia, como a venda injustificada de produtos e serviços abaixo do preço de custo.

Fonte: Agência Senado

Aluguel x PL

PL que indica isenção parcial ou total é polêmico

Isenção parcial ou total em aluguéis pode provocar caos no mercado imobiliário, alerta AABIC

Para Associação, proposta emergencial criada por circunstâncias do Coronavírus intervém em autorregulação e gera desequilíbrio no mercado de locação

O Projeto de Lei n° 1179, que institui normas de caráter transitório nas relações jurídicas durante o período da pandemia do novo Coronavírus (Covid-19), tem alto poder para tumultuar as negociações entre proprietários e inquilinos e gerar verdadeiro caos no mercado de locação.

A avaliação é da Associação das Administradoras de Bens Imóveis e Condomínios de São Paulo (AABIC), maior entidade representativa do segmento no Estado, sobre o Artigo 10, do Capítulo das Locações de Imóveis Urbanos, que foi retirado pelo senador Antonio Anastasia, idealizador do PL.

O artigo previa a suspensão total ou parcial do pagamento dos aluguéis de imóveis residenciais, com vencimento previsto a partir de 20 de março a 30 de outubro.

Segundo o PL, deveriam ser beneficiados pela regra de transição os locatários que sofressem alteração econômico-financeira, decorrente de demissão, redução de carga horária ou diminuição de remuneração, por força da crise pandêmica provocada pelo Coronavírus.

O Projeto de Lei também previa que, na hipótese da suspensão do pagamento, os aluguéis vencidos deveriam ser pagos em parcelas, cada qual correspondente a 20%, a partir de 30 de outubro deste ano.

A AABIC esclarece que o mercado imobiliário já tem maturidade e é suficientemente autorregulado para que proprietários e inquilinos negociem os valores dos contratos sem intervenção do poder público.

“Os acordos realizados até agora provam que o mercado não precisa de intervenção, nem de novas regras. Normas como as previstas no PL do senador Antonio Anastasia vão só trazer instabilidade numa relação que está equilibrada”, avalia José Roberto Graiche Júnior, presidente da AABIC.

Para o dirigente, o histórico de intervenção do poder público no mercado de aluguéis brasileiro demonstra que tanto proprietários como inquilinos saem perdedores, com demora significativa na retomada do desenvolvimento do setor.

“A intervenção do poder público em contratos e na relação entre proprietário e inquilino sempre criou insegurança jurídica, falta de credibilidade no mercado, com consequências para o setor como um todo”, avalia Graiche Júnior, ao observar as consequências negativas provocadas por crises econômicas em governos anteriores, que interferiram em taxas de reajustes de locação ou retomada de imóveis.

Nesses cenários, diz o presidente da AABIC, o ideal é que o mercado se autorregule. “Precisamos tomar cuidado para não desequilibrar os direitos, preservando um lado só, o inquilino ou proprietário. Temos como exemplo a recente crise econômica que passamos nos últimos anos: o mercado se acomodou nos preços e nas relações, sem a interferência do poder público”, diz. Segundo Graiche Júnior, as negociações tratadas por proprietários e inquilinos desde o início do isolamento social, com o acirramento da crise da pandemia, já preveem descontos nos valores do aluguel, além de parcelamentos, entre outras medidas.

Dados apurados pela AABIC com uma amostra das empresas associadas à entidade também revelam que dos cerca de 10.260 imóveis mapeados – sendo 70% residenciais e 30% comerciais – até esta data (1º de Abril), 7,2% deles registram algum princípio de negociação. Os pedidos de negociação alcançaram percentual de 3,7% da amostra dos imóveis residenciais. Já no segmento comercial, os pedidos totalizaram 17,1% da amostragem.

Prejuízo para proprietários

No entendimento da AABIC, o PL impunha um sério desequilíbrio nas relações de mercado ao sacrificar os rendimentos dos locadores. A associação afirma que compreende os esforços do Poder Legislativo em criar condições para mitigar as excepcionalidades provocadas pela disseminação do coronavírus, mas rejeita que o ônus recaia inteiramente sobre os proprietários, que seriam, na prática, os principais responsáveis por financiar o projeto.

Segundo levantamento da AABIC, cada locador no Brasil possui, em média, 1,6 imóvel registrado. “A medida impactaria, sobretudo, pequenos proprietários, totalmente vulneráveis”, alerta Graiche Júnior. De acordo com o dirigente, grande parte dos proprietários tem o aluguel como a principal fonte de receitas ou usa a arrecadação mensal como complemento de renda e da aposentadoria. Para equilibrar o mercado, a AABIC propõe validade de negociação reduzida, mês a mês, por exemplo, para que o País tenha condições de avaliar o impacto da crise da pandemia na economia.

Além disso, diz Graiche, as medidas pensadas no PL também podem ter alto impacto negativo nas empresas de administração, com risco de demissões em massa no setor. Somente as 90 empresas associadas à AABIC empregam atualmente mais de 5 mil pessoas.

A Associação também alerta que o projeto deixa brechas ao não sinalizar se o acordo entre as partes precisa ser formalizado. A proposta, segundo a AABIC, sequer explicitava a necessidade de comprovação documental por parte dos locatários, já que o inquilino não seria obrigado a comprovar a redução de renda ou de jornada para solicitar a suspensão do pagamento do aluguel.

Fonte: Síndiconet